segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Terceirização da saúde, avanço ou retrocesso?


A Prefeitura de São Paulo entregou parte de seus serviços de saúde para a administração de empresas privadas, qualificadas como Organizações Sociais (OS), entidades sem fins lucrativos. De acordo com o modelo - espécie de administração privada adotada pelo prefeito José Serra e que tem continuidade na gestão de seu sucessor, Gilberto Kassab -, instalações, equipamentos, servidores e recursos da saúde são transferidos para a gerência privada, sem necessidade de licitação.
A Justiça, porém, proibiu a terceirização da saúde, conforme divulgou a Imprensa. A juíza federal Maria Lúcia Lencastre Ursaia, da 3ª Vara Cível de São Paulo, acolheu em decisão liminar pedido do Ministério Público Federal (MPF) contra a Prefeitura e o governo federal, que afirma ser a terceirização na saúde contrária à Constituição e ferir a Lei Orgânica da Saúde (LOS). Segundo os procuradores, ambas só admitem a participação de instituições privadas em serviços do Sistema Único de Saúde (SUS) em caráter complementar.
Na ação, o MPF alegou que a Prefeitura está qualificando empresas privadas como Organizações Sociais (OS) sem licitação e que pretende "a privatização dos serviços públicos de saúde em São Paulo repetindo a experiência desastrosa com o PAS (Plano de Assistência à Saúde) desenvolvido entre 1995 e 2000" pelas administrações Paulo Maluf e Celso Pitta.
Para o MPF, a lei municipal é inconstitucional por descumprir a regra constitucional de que os serviços do SUS devem ser prestados pelo serviço público, e ilegal por colidir frontalmente com a LOS. Os procuradores argumentam que tanto a Constituição quanto a LOS só admitem participação de instituições privadas (em suas próprias instalações e com seus próprios recursos humanos e materiais) no SUS em caráter complementar.
Alega o MPF que o modelo de repasses à gerência privada sem a necessidade de licitação pode provocar danos ao SUS. Mais de 20 unidades ambulatoriais, por exemplo, já foram entregues à iniciativa privada sem licitação. De acordo com os procuradores, as OS receberão do poder público bens e recursos financeiros, além dos servidores, e haverá precariedade do controle da atividade e da aplicação dos recursos públicos.
Está a Prefeitura, de acordo com a decisão da Justiça, proibida de firmar novos convênios, mas sem necessidade da retirada das que já prestam serviços. Ou seja: as OS que já atuam não precisam deixar os serviços públicos, pois a juíza entendeu que se agisse de outra forma poderia causar prejuízo à prestação do serviço de saúde. A decisão liminar foi tomada em 9 de junho e a Prefeitura anunciou que irá recorrer para em seguida ampliar o gerenciamento não-público.
O caso é que, se o MPF considera a fórmula adotada como um modelo perigoso por transferir a terceiros uma responsabilidade que é do poder público e abrir brechas para o desvio e mau uso do dinheiro público, a Prefeitura argumenta que terá um controle rigoroso sobre os recursos bem como sobre o trabalho das OS e que o modelo, que permite maior agilidade na compra de medicamentos e contratação de pessoal, é a solução para melhorar o atendimento na rede pública.
O temor maior, sem dúvida, é com relação à transparência, que não pode ser afetada. É necessário existir condição para se verificar tudo o que pode estar por trás da aplicação desse projeto. Justamente porque a sociedade não pode ser prejudicada e receber um tratamento desqualificado, e muito menos os prestadores de serviço da área de saúde, que não poderão concorrer diante da inexistência dos concursos públicos. O que estamos presenciando em um primeiro momento é a concentração desses serviços por grupos privilegiados financeiramente em detrimento dos verdadeiros profissionais da saúde. Quem tem compromisso com a saúde pública são os profissionais do setor e não investidores e empresários.
Não cabe, em nome da rapidez de atendimento e da maior oferta de medicamentos, por exemplo, a prevalência de métodos suspeitos como os que são apontados pelo Ministério Público: riscos de desvio e mau uso do dinheiro público. As brechas, os espaços vulneráveis tem de ser cuidadosamente analisados. Afinal, as instituições privadas que irão gerenciar esses serviços de saúde voltados à população também serão responsáveis pela gerência de milhões de reais repassados pela Prefeitura. Basta lembrar que em 2005, o Fundo Nacional de Saúde transferiu R$ 846 milhões em recursos para o SUS em São Paulo.
Enfim, se você, biomédico e profissional da área da saúde, também considera este modelo prejudicial à sociedade, denuncie ao Ministério Público, faça a sua parte, apoie ações como esta, voltadas à defesa da população e da cidadania.
Marco Antonio Abrahão
Pres. Conselho Regional de Biomedicina
Fonte: CRBM

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