A Prefeitura de São Paulo entregou parte de
seus serviços de saúde para a administração de empresas privadas, qualificadas
como Organizações Sociais (OS), entidades sem fins lucrativos. De acordo com o
modelo - espécie de administração privada adotada pelo prefeito José Serra e
que tem continuidade na gestão de seu sucessor, Gilberto Kassab -, instalações,
equipamentos, servidores e recursos da saúde são transferidos para a gerência
privada, sem necessidade de licitação.
A
Justiça, porém, proibiu a terceirização da saúde, conforme divulgou a Imprensa.
A juíza federal Maria Lúcia Lencastre Ursaia, da 3ª Vara Cível de São Paulo,
acolheu em decisão liminar pedido do Ministério Público Federal (MPF) contra a
Prefeitura e o governo federal, que afirma ser a terceirização na saúde
contrária à Constituição e ferir a Lei Orgânica da Saúde (LOS). Segundo os
procuradores, ambas só admitem a participação de instituições privadas em
serviços do Sistema Único de Saúde (SUS) em caráter complementar.
Na
ação, o MPF alegou que a Prefeitura está qualificando empresas privadas como
Organizações Sociais (OS) sem licitação e que pretende "a privatização dos
serviços públicos de saúde em São Paulo repetindo a experiência desastrosa com
o PAS (Plano de Assistência à Saúde) desenvolvido entre 1995 e 2000" pelas
administrações Paulo Maluf e Celso Pitta.
Para
o MPF, a lei municipal é inconstitucional por descumprir a regra constitucional
de que os serviços do SUS devem ser prestados pelo serviço público, e ilegal
por colidir frontalmente com a LOS. Os procuradores argumentam que tanto a
Constituição quanto a LOS só admitem participação de instituições privadas (em
suas próprias instalações e com seus próprios recursos humanos e materiais) no
SUS em caráter complementar.
Alega
o MPF que o modelo de repasses à gerência privada sem a necessidade de
licitação pode provocar danos ao SUS. Mais de 20 unidades ambulatoriais, por
exemplo, já foram entregues à iniciativa privada sem licitação. De acordo com
os procuradores, as OS receberão do poder público bens e recursos financeiros,
além dos servidores, e haverá precariedade do controle da atividade e da
aplicação dos recursos públicos.
Está
a Prefeitura, de acordo com a decisão da Justiça, proibida de firmar novos
convênios, mas sem necessidade da retirada das que já prestam serviços. Ou
seja: as OS que já atuam não precisam deixar os serviços públicos, pois a juíza
entendeu que se agisse de outra forma poderia causar prejuízo à prestação do
serviço de saúde. A decisão liminar foi tomada em 9 de junho e a Prefeitura
anunciou que irá recorrer para em seguida ampliar o gerenciamento não-público.
O
caso é que, se o MPF considera a fórmula adotada como um modelo perigoso por
transferir a terceiros uma responsabilidade que é do poder público e abrir brechas
para o desvio e mau uso do dinheiro público, a Prefeitura argumenta que terá um
controle rigoroso sobre os recursos bem como sobre o trabalho das OS e que o
modelo, que permite maior agilidade na compra de medicamentos e contratação de
pessoal, é a solução para melhorar o atendimento na rede pública.
O
temor maior, sem dúvida, é com relação à transparência, que não pode ser
afetada. É necessário existir condição para se verificar tudo o que pode estar
por trás da aplicação desse projeto. Justamente porque a sociedade não pode ser
prejudicada e receber um tratamento desqualificado, e muito menos os
prestadores de serviço da área de saúde, que não poderão concorrer diante da
inexistência dos concursos públicos. O que estamos presenciando em um primeiro
momento é a concentração desses serviços por grupos privilegiados
financeiramente em detrimento dos verdadeiros profissionais da saúde. Quem tem
compromisso com a saúde pública são os profissionais do setor e não
investidores e empresários.
Não
cabe, em nome da rapidez de atendimento e da maior oferta de medicamentos, por
exemplo, a prevalência de métodos suspeitos como os que são apontados pelo
Ministério Público: riscos de desvio e mau uso do dinheiro público. As brechas,
os espaços vulneráveis tem de ser cuidadosamente analisados. Afinal, as
instituições privadas que irão gerenciar esses serviços de saúde voltados à
população também serão responsáveis pela gerência de milhões de reais
repassados pela Prefeitura. Basta lembrar que em 2005, o Fundo Nacional de
Saúde transferiu R$ 846 milhões em recursos para o SUS em São Paulo.
Enfim,
se você, biomédico e profissional da área da saúde, também considera este
modelo prejudicial à sociedade, denuncie ao Ministério Público, faça a sua
parte, apoie ações como esta, voltadas à defesa da população e da cidadania.
Marco Antonio
Abrahão
Pres. Conselho Regional
de Biomedicina
Fonte: CRBM
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